sexta-feira, 29 de junho de 2012



A Despedida do Mago Manco

            Todos nós, alvinegros de força convicta, sabemos das dificuldades de vivenciar certos sonhos. Sempre que tal sensação nos aflige, torcemos, imediatamente, por um banho de água fria. Retirantes das nove e retumbantes das três, não nos iludimos com esmolas generosas. Tão pouco somos santos.
           
Somos humanos muito mais humildes e poderosos que estes. Santidade é coisa para os fracos, que mesmo após a morte, insistem em querer a auto-afirmação à custa alheia. Preferimos o sutil prazer de aterrorizar o cotidiano dos outros, estando vivo ou não.
           
Porém, nem todo ser ultrajante e arrogante como um bom botafoguense, sabe de suas limitações. E como um bom professor primário, não estou aqui para ensinar coisa alguma. Apenas quero revelar a importância de certos delírios. Entendam certas como raras.
           
Em 2009, após dois anos de roubos indecorosos e descarados, recebemos diretamente de algum lugar da idade média, um ser suntuoso. Seu nome, que de tão brasileiro acabou adotando tons irônicos, nos agradou, mas preferimos coroá-lo precocemente mago de nosso reino. E antes que pudéssemos considerá-lo humano, profetizamos que este era digno de nos salvar. Desculpem-me senhores, mas nossa salvação nunca veio da noite para o dia. Nunca. A nossa salvação sempre veio, exatamente, de forma oposta ao que as grandes corporações religiosas ditam.
           
Sendo assim, em seu último jogo pelo Botafogo daquele ano, tomou três tiros em dez minutos e machucou-se. O nome do inquisidor: Willians. E mesmo com toda a magia que pensávamos que o nosso salvador tinha, foi-se manco. Um ano e meio depois, retornou ao nosso reino. E mesmo manco, continuamos acreditando nele. Em vão.
        
E agora, Maicosuel vai nos deixar orfeões pela segunda vez. A junção da ciência com a igreja se aproxima, mago manco e o inquisidor assassino jogarão pelo mesmo time; E mantenho minhas dúvidas com relação as severas consequências de tal afronta. Mas não se apavorem, meus caros. Temos em nosso elenco um ser capaz de entender os sofrimentos de um órfão. John Lennon está conosco. E posso garantir-lhes, deliciando-me em suaves delírios, que este reviverá anos de glorias ao lado de Creedence Seedorf.

segunda-feira, 25 de junho de 2012



A Itália Botafoguense


            Podem duvidar, falar que é locura ou utilizar qualquer outra argumentação infalível, mas afirmo desde então que a Itália aprendeu muito com o Botafogo. Não só aprendeu, como agora cisma em querer imitar-nos, da forma mais plagiosa possível. Vide a cavadinho do Pirlo. Essa ligação da Itália com conquistas improváveis e o desprezo por campeonatos fácies tem uma origem. Arrisco dizer que sem o Botafogo, a Itália não teria história no futebol. Não teria referência.
           
O italiano, por natureza, é aquele ser que gosta de ser xingado. Ele não sente estímulos na vida sem ao menos ouvir sua mãe ser convocada para trabalhar no cabaré mais próximo. Em outras culturas, este tipo de declaração é uma afronta. “Mete a minha mãe no meio que eu meto no meio da tua”, diria o transtornado em crises existências. Mas o italiano não. Ele utiliza de sua superioridade moral para seguir em frente. Como prova de tamanha ignorância puritana, Benito Berlusconi é ídolo na Itália. Só na Itália.
           
Da política ao futebol, é um pulo. Ao menos para nós. Italianos, assim como botafoguense, acham que as duas coisas andam juntas. Todo ano algum jogo do Botafogo é adiado por conta de seu rival. Se o adversário não pode comparecer ao compromisso, W.O. Às vezes me pego pensando: A CBF é um órgão político que trata de futebol? A CBF é um órgão futebolístico que não trata de nada? A CBF é um órgão ou uma simplória espécie de câncer? Admito que qualquer resposta não me será satisfatória.
           
Em 2006, à véspera da Copa, o campeonato italiano revelou suas propriedades travessas. E os comentaristas vespertinos e prematuros analisavam o futuro fracasso da azurra. Conseqüência? O título mundial. Meus caros, não caiam dessa balela moralista assustadoramente evangélica que esse pessoal proclama. Manipulação de resultado tem em qualquer lugar. E é exatamente nesse ambiente pessimista que nós nos criamos. O péssimo é sempre mais atraente que o ótimo. Tragédias são muito mais emocionantes do que as comédias. Sem o Botafogo no mundo, a Itália sucumbiria a tais injurias e perderia. Nós estamos no mundo por um único motivo: Acabar com a falsa felicidade alheia. Não por menos, quando um jogador dá algum drible desconhecido por lá, eles profanam: “À lá Garrincha”.
           
            Ontem, perdemos para a Macaca no Grande Engenho. Eu acharia vergonhoso ganhar de um time com este apelido. Acordei hoje e fui à padaria tomar um café. No meio do meu pacifico primeiro cigarro, Seu Manoel ameaça uma provocação:

            -Que derrota ontem, hein? – e começou a contar-me como foi o jogo, achando que eu não havia assistido. Afinal de contas, eu tinha tudo para estar possesso, mas estava ali, em uma calma quase que contagiante – Aí, o jogador ficou na cara do gol e chutou. 2 a 1. E o Botafogo...

            -Calma, Seu Joaquim – interrompi apagando o cigarro - Primeiro, não pronuncie esse nome em vão. E segundo, o senhor já ouviu as expressões piedade e “azar de campeão”?

terça-feira, 19 de junho de 2012





Quando Os Bravos Fogem, Os Covardes Vão Embora

A espera está demorada e apesar de todas as impossibilidades que sempre nos agradaram, nós continuamos aqui, à sua disposição. Notícias e previsões pouco condizentes estão batendo em nossas portas semanalmente, há anos. Mas não podemos negar, conforme o tempo passa, está demora se transforma, cada vez mais, em algo magnificamente colossal.
           
Não é de hoje que nós gostamos de suspenses. Aliás, em qualquer instância, nada para qualquer botafoguense é de hoje. Temos o prazer incomum de poder comparar tudo com alguma coisa do passado. Este dom é raro, e de extremo perigo social. O risco de fecharmo-nos em análises pouco comprobatórias para os demais, assola-os da mesma forma em que uma frágil presa sente medo do perfume de seus concorrentes alimentícios.
           
Mas não podemos, jamais, iludir-nos com a ignorância alheia. E, com um toque de paciência, veremos que a melhor solução para tais conversas é a fuga. “Ora pois, mas fugir nunca foi uma opção coerente”, diria o português da esquina. Pois bem, fuja dele também. Os outros só servem para atrasar nossas próprias conclusões.
           
Sendo assim, em 1911, ano mais importante da história do futebol carioca, o quadro de sócios alvinegro diminuiu quase pela metade. O motivo? A fuga de nossos corajosos patronos. Eles fugiram da arrogância dos ricos. Fugiram da argumentação conservadora dos bigodudos. Fugiram das mentiras entrelaçadas nos discursos altruístas. Sempre as mentiras. E, como não havia de ser diferente, todos os imbecis foram embora. Não por rebeldia, mas por falta de compreensão. Assim feito, os trezentos remanescentes formaram o verdadeiro Botafogo. E a partir disto, construímos nossas próprias características, tão peculiares e temidas.

Conforme o tempo passa, mais sinto necessidade de outra transformação desse nível. O Botafogo nunca foi um clube condizente com a massa. Nossos times nunca souberam jogar em estádios lotados. E que arremessem paralelepípedos aqueles que discordem. Botafoguense não entra em discussão, declara guerra. Botafoguense não pede apoio, se desespera com palavras como esperança e solidariedade. Botafoguense não busca mudar o mundo, ao menos não antes de achar sua própria salvação.

Por essas e outras que nós, integrantes de uma espécie que deveria estar em extinção, proclamamos:

“O último reduto underground voltará à força máxima. E todas nossas noites mal dormidas se virarão contra vocês, ordinários carentes e solidários; assim nas trevas, como no céu!”

terça-feira, 12 de junho de 2012

Victor Junior, O Adicto

Após meses sem algum ser impreterivelmente convencido de que sua vida se resumia as suas tentações, o caminho da luz reapareceu. E esse tal de Victor Junior demonstra com perfeição o que é ser viciado no objeto de trabalho. Para se ter uma idéia, ele não consegue ficar quieto em bancos de reservas. Ele foge, misteriosamente, de seus companheiros, e quando menos se espera, lá está ele. Trabalhando como gandula.


Esta fixação, que tomarei a liberdade de chamar vício, no entanto está aquém de julgamentos pretensiosos. Ninguém poderá dizer, com absoluta convicção, que obsessão é um defeito. E levando a vida como qualquer outro mortal, ele não aguenta de ciúmes ver a pelota com outro. Ela lhe pertence. Ao menos em seu âmago. E este sentimento é louvável. Porém, quando a tem, não sabe muito bem o que fazer, de tamanho ecstasy. Traz ela pra cá, ela vai pra lá. Chama-a de querida, e esta corre para a lateral. Ele persiste como qualquer pedinte de lanchonete e, hora ou outra, ela volta. Assim, gruda nela como o mel lambuza o urso. E um segue com medo do outro.

Com tamanha empolgação, entrou em campo domingo procurando a coitada. Não tardou a achá-la.

Primeiro gostaria de dizer que é inadmissível O Glorioso perder para o Náutico. E digo isso sem pretensão de limitação. O Botafogo não pode perder para um time com este nome, em quaisquer circunstâncias. E mais, em qualquer esporte.
           
Mas, ainda precisávamos da confirmação. E o lance do terceiro gol adversário foi esplendorosamente saudável pra este time. Ele, navegando na pura ingenuidade de um bravo guerreiro pré-histórico, acredita que todos a sua volta vêem o mundo da mesma forma. Pensando, ou não, que nosso terceiro goleiro era aficionado como ele, recua uma bola arriscada. Ora pois, um atleta que perde a vida sendo terceiro goleiro não pode querer descer ao reino dos viciados. Gol. A ilusão de igualdade sentimental é algo que apenas os neuróticos conseguem ter. E, sendo, culpa dele, nada mais me resta, a não ser um bem-vindo.

Observando um pouco mais severamente a jogada, está foi a prova que nos faltava. É ele. O vagabundo que nós, Botafoguenses, temos orgulho de hospedar. Após meses de solidão, o nosso time volta a ter um elenco característico. O nosso time nunca, e repito, nunca, conseguiu alguma coisa sem ter ao menos um viciado no elenco.

segunda-feira, 11 de junho de 2012


Elkeson, O Desgraçado

            Nunca acreditemos naquilo que vêm de formação inescrupulosa. Qualquer gênero de ser que tenta burlar certas conseqüências contra si mesmo, hora ou outra, acaba rompendo o silêncio da calmaria. E, sobre tais afirmações, pergunto: Seria Elkeson tão certo de si? E sem pudor ou cinismo, respondo: Ele está amaldiçoado.

            Apenas a tentativa de fazer coincidir terríveis acontecimentos com algum ser amaldiçoado, está fadado ao perigo da sabedoria. Alguns se sentem corajosamente capazes de investigar, outros preferem o conforto de suas poltronas 2000. Mas acreditem, este caso superou todas as expectativas otimistas e bonitinhas. Este filisteu futebolístico está sendo amaldiçoado por, ninguém menos, do que Deus. E garanto-lhes, o Botafogo nunca foi lugar de pessoas esclarecidas. A dúvida paira em nossas cabeças como urubus pousam sobre as carniças. Observe as primeiras palavras proclamadas por este sujeito, assim que pisou no terreno errado pela primeira vez na vida:

            “-Felizmente, deu tudo certo. Agora, quero mostrar meu futebol e fazer o meu melhor pelo clube.”

      Fugindo da normalidade das falas improvisadas dias antes pelo empresário, deu sua primeira demonstração de perigo. Fez-nos acreditar que o seu melhor nos era suficiente. E nós, fanáticos alucinados navegando em direção ao abismo, pedimos socorro a nossa última esperança. Em vão.  No exato momento em que qualquer das mais singelas incógnitas foge da cabeça de algum Botafoguense, podem ter certeza. Nem tudo vai sair bem. Ou, mais seriamente, quase nada sairá nos conformes. Não tardou, o dia escureceu. Porém, apenas quando a maré abaixa podemos analisar o estrago. Antes tarde do que nunca.

       E assim, fui hoje convocado para assistir Botafogo e Cruzeiro. Entrei no Grande Engenho mais moderno do mundo sem preocupações. Sabia apenas que alguma coisa de sobrenatural iria acontecer, e como qualquer bom acionista, compareci. Só não esperava tanto.

         Tudo seguia na mesma ternura afável de qualquer jogo alvinegro. Juizes claramente mal-intencionados, a fúria divina e a torcida tuberculosamente desnecessária e maléfica. Até que em meados do segundo tempo, olho, magneticamente, para o banco de reservas. Instantaneamente, o técnico chama ele, o desgraçado. E a torcida, após o delay natural, aplaude. Sem saber o significado de tal ato, e muito menos com vontade de entendê-lo, observei o primeiro, dos três raios cósmicos. Gol do oponente. Continuo a observar o andar daquele bicéfalo em direção à placa de substituição. Pisa em campo. E antes de pensar em respirar, Outro Gol. Toca pela primeira vez na temida. Virada benzida.

        A partir deste tipo de decorrência, passamos a questionar-nos sobre tais poderes divinos. Devemos orgulhar-nos de tê-lo na equipe, um ser maravilhosamente querido pelos adversários e com uma predestinação destruidora invejável? A Solução resume-se em uma palavra. Síria. Aproveitando a brecha das fortes orações, talvez ele pudesse achar a salvação da humanidade passando alguns verões lá.