quinta-feira, 28 de novembro de 2013





A Última Página da Enciclopédia



E lá foi Nilton Santos encontrar tantos outros santos. Luto ou agradecimento? Pesar, pesado ou apenas contente? Mesmo não sendo do seu tempo, agradeço. Agradeço de coração, imerso na estrela que te conduzia. E tenho certeza, continuará conduzindo. Tu és eterno, monstro. Teus concorrentes eram apenas laterais ou pontas abusados. Mas não tu. Tu eras gênio, tu eras a classe operária intelectual, tu eras o futebol.
No último adeus compreendi que imortal não é o burocrata que serve a Academia Brasileira de Letras. De fato, imortal é, simplesmente, aquele que não morre. Aquela bandeira esticada sobre o caixão me confirmou isso. Sarney morrerá, mas Nilton Santos seguirá eterno, eu afirmo. Afinal, do que valem letras soltas perto de uma enciclopédia completa ou de apenas uma estrela solitária?
Junto contigo foram histórias e gerações de jogadores romanticamente ingênuos. Tão ingênuos que bobos eram os outros. O futebol nunca mais foi o mesmo depois de ti. Ou devo dizer, o futebol jamais será o mesmo depois de ti. Aceitar o trabalho como lar e dali construir família e amigos era, e continua sendo, para poucos. Pouquíssimos. Para raros, como tudo no Botafogo. Para os monstros, apenas, como tudo no Botafogo.
Se Garrincha (teu irmão, compadre, afilhado e filho, porque não?) cumpriu perfeitamente o papel de Nietzsche dos gramados, saiba que tu foste a melhor interpretação futebolística de Hegel. E jamais cansarei de dizer, obrigado por tudo. O apelido não lhe fora dado por estatísticas superficiais ou por apenas seus dotes de carpintaria. Fora lhe concedidos, principalmente, por ter sido o monstro da própria enciclopédia.
Tua nareba banhada pelo bigode cinzento ainda é imitada nas lojas de mágica. Era apenas pôr uns óculos naquela face que ninguém acreditaria que tais genéticas fossem originais. Punha um destro na lateral esquerda e ninguém acreditaria que tal genética fosse original. Punha um malandro de joelhos enviesados para jogar que ninguém acreditaria que tal genética servisse pro esporte. Ninguém, menos tu, monstro. Ou melhor, ninguém antes de ti. Tu eras diferente dos demais.
Afirmo não estar triste pelo seu falecimento. Desculpa, meu velho, mas tu não eras humano para chegar ao ponto de falecer.
Incansável, sigo: Muito obrigado.


sexta-feira, 6 de setembro de 2013





Bem-vindo Hyuri botafoguista

Após o derradeiro apito, as especulações começaram. O sábio profetizou:
            -Esse garoto é o novo Maradona.
            Enquanto o cético apenas profanou:
            -Esse garoto é o novo Vitinho.
            Eu, entre um ser teoricamente iluminado e um imbecil sem criatividade, ou criação, não sei, mantive minha mediocridade e disse:
            -O Vitinho é o novo Hyuri.
            O cheiro de fezes infectou o ar e ambos me olharam torto: O sábio suspendeu a sobrancelha pela primeira vez na vida; e o cético riu ironicamente pela última. Meu remédio já havia se esgotado e o refil não me deixou reabrir a boca ou pedir desculpas.
            Porém, assim espero, vocês não são sábios ou céticos. E digo que espero pelo simples fato de não merecer vossas atenções. Sábio é Jesus Cristo que se suicidou por desprezo a humanidade e cético é Sócrates que se suicidou por justiça. Ou o inverso, ninguém sabe. Ninguém sabe!
            Calma Zaratustra, já voltarei ao Hyuri. Esse não é sábio nem cético. Botafogo não tem espaço para isso. Botafogo não tem espaço para jogadores perfeitos, cracks ou mocinhos simpáticos. O Botafogo é lugar de gênios, monstros, loucos e imperfeitos. Aqui, mais vale a imaginação que a imagem em si.
            Quando um normal pisa em General Severiano, o ato espontâneo do segurança é espancá-lo até a inconsciência para em seguida aterrizá-lo no Pinel. Ou por acaso vocês acham que a proximidade entre o Botafogo e o manicômio é desproposital? Nossas idéias e ídolos saíram de lá. O nosso sarcasmo é incompreensível, até mesmo para nós, e nossa história é insana. E mais uma vez o Botafogo provou ser maior que qualquer humano. E Chico Sá, seu bobão, o Seedorf ou qualquer outro jamais conseguirá acabar com o botafoguismo.
            E os Yuris pouco nos perturbaram. Aliás, Vitinho que vá se atolar na neve ao lado dos russos. Eu prefiro o Hyuri, de nome corretamente errado e mais perverso que qualquer encasacado. Publicamente torcedor do Botafogo, Hyuri mostrou em campo e na fala que está muito à frente de qualquer japonês negro que opte por morar na Rússia.
            O maior desejo dos católicos é encontrar Deus ou qualquer outro santo, por mais infame que seja. Mas Hyuri é diferente, tem outra espécie e gênero de religiosidade. Ele sabe que não cantamos “a bênção João de Deus, nosso povo te abraça”. Ele não é aristocrata para achar que sabe o significado de bênção, Deus e povo. Tão pouco almeja abraçar qualquer João. O maior desejo de Hyuri é entrar para do livro sagrado dos botafoguistas.
            Bem-vindo Hyuri, você conseguiu.
            Brian Johnson tinha razão, “Botafogo is just... Botafogo”!

terça-feira, 18 de junho de 2013



Eu tive um pesadelo essa noite...


Eu tive um pesadelo essa noite em que jovens ocupavam as ruas. Eu tive um pesadelo essa noite em que a cidade parava para aplaudir a juventude e toda sua força. Eu tive um pesadelo essa noite em que todas idéias se faziam válidas, menos as terceirizadas por partidos. Eu tive um pesadelo essa noite...
Os jovens não tinham medo. E acredite, até mesmo o calvo grisalho de bengala demonstrar uma juventude invejável aos olhos passageiros. Eles não saíram de casa para ir à balada ou ir brincar de amarelinha. O parque de diversão deles, agora, era a cidade. Eu tive um pesadelo essa noite que a cidade era deles.
Anarco-punks, comunistas, baitolas e batutinhas, todos se fizeram presente. Se a união faz a força, foi exatamente na singularidade de cada um que me assustei e quase despertei. Não era para eles estarem do mesmo lado. Eles nunca estiveram do mesmo lado. E o pior, todos estavam confiantes e sorridentes. Seus dentes eram visíveis mesmo encobertos por panos. Sim, aqueles eram os caras-tampadas. Eu tive um pesadelo essa noite...
Seus rostos tampados não eram por vergonha. Talvez fosse também por proteção. Mas era principalmente por ideologia. Eles eram eles, sem nome, RG, CPF ou qualquer burocracia que lhes perturbe. Eles mostraram que tinham coragem e ousadia, e essa sempre foi a ideologia que mais temi. Eles eram jovens, deveriam estar bebendo ao som de sertanejo. A rua ocupada por caras-tampadas? Isso nunca poderia ser controlado. Eu tive um pesadelo essa noite...
Os partidos políticos sofreram uma espécie nova de coerção-social. Suas bandeiras não representavam mais os jovens. Como isso foi acontecer? Eles têm de se organizar em grupo. Eu prezo o diálogo entre os grupos. Mas na cidade não havia mais grupos. Havia um grupo: o povo. E qual foi a reação dos partidos? Abaixarem suas bandeiras e permanecerem civis. Eles nunca se sentiram tão parte do povo quanto naquele dia. Eu tive um pesadelo essa noite...
O povo se dividiu após o primeiro ato. Todos que prezavam a paz e o movimento pacífico foram para suas casas ou para os bares aos arredores, felizes pelo belo desempenho que tiveram. Mas o problema era outro. Agora eles tinham escolha, pois parte do movimento seguiu. E os remanescentes não queriam mais brincar. Desta vez, quem não queria diálogo eram eles. Eles e suas caras tampadas. E a assembléia legislativa ficou pequena, a polícia foi expulsa, o tempo parou e a fumaça sumiu. Mas o que eles queriam? O fim do voto parlamentar secreto? O fim dos salários que os parlamentares tanto suavam para conseguir? Ou apenas mostrar sua força? Na dúvida, prefiro afirmar que eles queriam tudo isso. Eu também já fui jovem e também queria o mundo naquela idade. Mas eles? Eles querem acabar com o meu mundo! E eles me aterrorizaram. Eles eram muitos. Eles eram fortes. Eles eram contra o estado de direito. Eles eram contra o estado. Eles eram contra todos os direitos que nós conquistamos. Eles queriam começar tudo de novo. Eu tive um pesadelo essa noite...
E os bombeiros, ao passarem, eram homenageados pelos jovens. Ao som de aplausos e congratulações, eles expunham suas fases para fora dos caminhões, esbanjando largos sorrisos, e apertavam as mãos de todos os manifestantes. Eles também eram manifestantes. Eles também tinham estado em confronto comigo recentemente. Eles também eram parte daquilo. E ao saltarem de seus veículos e correrem em direção os feridos, os demais manifestantes faziam cordões humanos para facilitar o trabalho. Porque? Eles não estavam ali para ajudar alguém. Eu achava. Precisava começar justamente pelos bombeiros? Eu nunca tinha visto um funcionário público ser tão prestigiado quanto naquele dia. Eu tive um pesadelo essa noite...
A estátua de Tiradentes trajado de Jesus Cristo explodiu e o povo celebrou. A assembléia legislativa só seria reaberta após o fim dos privilégios de seus servidores e do voto parlamentar secreto. O povo estava dentro dela e não haveria bomba que os tirassem de lá. Eles não queriam a democracia representativa. Eles se auto-representavam. Mas eles não podiam fazer isso. Eles eram muitos. Eles eram jovens. Eu tive um pesadelo essa noite...
Nenhum policial podia mais andar fardados nas ruas, antes que de seu oficio fosse tirado o serviço militar. Nenhum ônibus público podia mais circular às ruas até que uma investigação culpasse a máfia dos transportes pelo descaso do serviço. O pescoço dos mafiosos nunca valeu tanto. Não havia um monumento em toda a cidade que homenageasse políticos. Nomes de ruas foram trocados. Corruptos sofriam perseguição pela cidade. Obras públicas que usávamos para lavar dinheiro foram ocupadas. O salário mínimo tinha chegado à valores astronômicos. Professores eram os profissionais mais bem pagos, junto com os médicos. E os advogados aprenderam a se contentar com o mínimo. Quem me defenderia? Eu tive um pesadelo essa noite...
Eles perderam o medo e eu não sabia o que era isso até então. Onde estavam todos os aparatos de controle populacional que demoramos anos montando? Não funcionavam mais. Eles inverteram o jogo. O único controle exercido agora era o político. Eu deveria ter sido engenheiro. Ser político não me trazia mais nenhuma vantagem. Eu tive um pesadelo essa noite.

Eduardo Cabral

terça-feira, 7 de maio de 2013




O Velho Alcindo


Alcindo é um sujeito pacato, que vive nas cercanias de Madureira e nunca teve muito do que se preocupar, a não ser o time que torce. Assim como todos os demais de sua tribo futebolística, ele optou pelo Botafogo por puro delírio de elegância. E digo optou, porque nunca foi forçado a tal. O único ser teimoso que também acreditava no impossível dentro de sua família era seu falecido avô. Problemas na escola e em jantares de família sempre fizeram parte de seu cotidiano. Mas hoje, no auge dos seus 77 anos e já cansado de contar os privilégios do absurdo, ele não discute mais com qualquer um. Assim como o time que escolheu torcer, sua discussão se limita para poucas e boas mentes.
    Na última sexta-feira, após uma semana exaustiva e pouco produtiva, pois havia perdido todas as partidas de xadrez disputadas na praça, resolveu que deveria ir à Volta Redonda assistir à final. Vale lembrar que nenhum botafoguense decidi ir a qualquer jogo; o botafoguense é convocado pelos mesmos mistérios maravilhosos que enlouqueceram Nietzsche. E dessa forma, qualquer obstáculo não seria capaz de remediar tal loucura. O primeiro desafio, aquele que faria até Hércules desistir de trabalhar para tirar folga, entrou em seu caminho: os ingressos se esgotaram.
    Mas Alcindo, dentro de sua magnitude ultrajante proveniente de anos torcendo pelo time que tanto lhe ensinou sobre a vida, sabia que estaria infiltrado no Raulino de Oliveira domingo. Longe de ser um cara arrogante ou violento, ele não tardaria a matar algum coitado para conseguir seu ingresso. Idosos não podem ser presos, mas podem e devem assistir aos jogos de futebol. E Seu Alcindo não é o tipo de velho que entra de graça em estádios. Costuma dizer que isso é coisa para sedentários.
    Sábado de manhã, seu neto mais chato o ligou e avisou sobre a venda de ingressos remanescentes dos sócios. Perguntado pelo jovem se poderia o acompanhar ao jogo, Alcindo foi sucinto:
    -Acompanhar eu não acompanho. Vá procurar alguma menina para ir com você. Mas não se esqueça de comprar o meu ingresso! – e pôs o telefone no gancho com um sorriso colado pela sobra de Corega.
    Almoçou com suas pessoas favoritas: sua espoca, Garrincha, Che Guevara, Louis Armstrong e Dom Quixote; todos presentes por fotografias, menos o último que estava parado como uma estátua na cadeira à sua esquerda. Já cansado de tanto conversar e com a barriga cheia, decidiu que era hora de começar a concentração para o jogo decisivo. Escovou a dentadura e foi tirar vantagem na praça. Como qualquer sábado ensolarado em Madureira, todos os idosos estavam jogando dama. Diziam que xadrez era muito sério para finais de semana. Aproximou-se do Seu Juarez, e disparou:
    -Estou indo para Volta Redonda assistir a decisão... – e Juarez, um idoso abusado e dono de uma barriga latifundiária, perguntou:
    -E você realmente acha que seu time ganhará do meu tricolor?
    E aquela singela pergunta rejuvenesceu Alcindo 45 anos, e sua bengala deixou servir como apoio para virar uma arma medieval. Ninguém sabe onde Juarez foi atingido, só é sabido que este nunca mais pisou na praça. Passados 50 minutos, Alcindo se explicou aos remanescentes:
    -Não fiquei com raiva dele. Fiquei com raiva de mim, pois esqueci que não se deve falar com tricolores em semana de jogo – e outro amigo, um trovador, continuou a conversa:
    -Mas então Alcindo, quem leva o caneco?
    -Apostaria no América, mas não apostaria no Botafogo. Nunca vi o meu time ganhar quando estava confiante. O meu time não é previsível como os demais, por isso a graça de torcer por ele. Eu gosto de ser surpreendido no final de um filme, enquanto vocês preferem continuar assistindo Xuxa – e se retirou. Chegou em casa e foi dormir. Sabia que o dia seguinte seria longo.
    Acordou ás 5 da manhã, pois perdera o sono para a ansiedade. Às 11, seu neto ligou avisando que passaria meio-dia para buscá-lo. Tomou um banho, almoçou com seus amigos favoritos e foi esperar na portaria. Quando seu neto estacionou o carro na frente de seu prédio, ficou surpreso ao ver uma linda moça no banco de passageiro. Não era sempre que o jovem escutava seus conselhos, e quando escutava, executava-as de forma pouco virtuosas. Mas dessa vez o acerto foi preciso. Além de linda, também era botafoguense.
    Chegando ao estádio, deixou o casal surpreso quando se despediu. Ambos acharam um absurdo um senhor de 77 anos assistir ao jogo sozinho, mas Alcindo não estava sozinho. Sabia que outros 8 mil botafoguenses estariam ao seu lado. Antes de o time entra em campo, ele se levantou e não conseguiu assistir o primeiro tempo sentado. E toda sua ousadia foi posta pra fora quando viu Marcelo Mattos tomar uma porrada em plena área, próxima a torcida alvinegra. E como qualquer bom torcedor, começou a brigar com um desconhecido quando ouviu:
    -Expulsa o Thiago Neves.
    Alcindo, como um garoto de 22 anos, caminhou até o profanador e disse:
    -Expulsa é o cacete. Espanca, porra! – e o garoto acatou o aviso e mudou o linguajar.
    3 minutos depois assistiu Bolívar, o zagueiro de nome mais bonito da história do Botafogo, dar um encontrão no camisa 11 adversário, levantar a cabeça, encarar o mau-caráter e mostrar que ninguém estava ali para brincar. Automaticamente, Alcindo lembrou da história que seu avô lhe contava sobre o Botafogo e América de 1911, e sentiu que aquela equipe gloriosa poderia voltar a ser também “O Clube de Capa e Espada” de outrora. Um time de garotos e veteranos de verdade, onde irmãos mais velhos defendem os mais novos e onde ninguém aceitaria ofensas gratuitas. Lágrimas nunca haviam lhe feito companhia até aquele dia. Acreditou até que seu avô ficaria orgulhoso com a postura do nosso atleta.
    Mais do que nunca, o Botafogo merecia a vitória e sempre que a torcida começava a cantar o hino, Alcindo apenas gritava no verso: “Não podes perder, Perder pra ninguém!”
    E após o primeiro gol legítimo ser furtado na mais leviana cara de pau, o time com feições literárias marcou. O Faraó Turco não tardou a satisfazer seus súditos. Perdeu a primeira batalha, mas jamais entregaria a guerra. Seu verdadeiro oponente, o bandeirinha, nada pode fazer a não ser correr para o meio de campo. Subitamente, toda a raiva de meses passou, e Rafael Marques se tornou herói. No domingo, qualquer um viraria herói; qualquer um trajado de preto e branco. E as coisas conspirarão para tal: mesmo o mais azarado dos humanos conseguiu marcar seu gol.
    A partir do intervalo, Alcindo sentiu uma confiança inédita. Algo lhe dizia que nada interferiria no resultado e conseguiu, pela primeira vez na vida, assistir parte de uma decisão sentado. Viu Edinho tomar um drible com sotaque holandês e ser substituído 5 minutos depois, com cabeça baixa, ainda à procura da bola. E percebeu que até os adversários estavam admirando o campeão, mesmo que de forma pouco convencional.
    Viu também o juiz de pouco juízo anular mais um gol alvinegro. Dória Gray merecia aquele gol, e o Holandês sabia disso. Caminhou até a marca do pênalti, tirou a bola das mãos de Lodeiro, estufou o peito, mirou no travessão e entortou o poste suspenso. Ele sabia que aquele gol deveria continuar com a assinatura do jovem. Seedorf aceitou o papel de Lord Henry que ainda faltava ser preenchida.
Mas Alcindo, botafoguense calejado, só esbravejou “É campeão!” no apito final. E gritou “É campeão!” por ele, pelo neto, pela esposa, por Garrincha, por Dom Quixote, por Abelardo De Lamare, mas principalmente por seu avô.
Sabia que era apenas mais um título do Botafogo que cientistas do mundo todo tentariam explicar em vão. Alcindo sabe, acima de qualquer coisa, que o Botafogo não é para ser explicado; É para ser admirado!
Vida longa, Seu Alcindo!
           

domingo, 14 de abril de 2013




Quando o profeta fica em dúvida

         Ausentei-me nestes últimos tempos por conta de uma mallandragem inesperada, mas espero voltar ao mesmo ritmo de outrora. Preciso começar já alertando-vos sobre o meu receio com relação a toda esta euforia alvinegra. O nosso clube nunca ganhou nada partindo da alegria ou da excitação. Nossas glórias são provenientes de muitos ensaios, pancadarias e discussão. E vale ressaltar que metade das decisões do Botafogo são resolvidas na mesa de bar, pois é lá aonde montamos nossas assembléias constitucionais do futebol ultrajante.
         Nós devemos nos precaver, desde já, a qualquer imprevisto que apareça. E, faço questão de frisar, surpresas nunca foram surpreendentes no nosso habitat. Todos reclamaram do pagamento integral de nossa dívida a partir dos direitos televisivos. Todos reclamaram que o Grande Engenho foi fechado de forma irregular. Todos reclamaram da expulsão absurda do Seedorf. Beleza, nos primeiros dias após estes acontecimentos eu também fiquei revoltado. Mas o Botafogo não merece a revolta infantil de seus discípulos. Se ganharmos sem ter do que reclamar, não comemoraremos. Gostamos que nos roubem, porque gostamos de sobressair aos infames desta terra.
         Mas isso não é algo relevante perante o primordial erro. Estamos cantando vitória antes da hora. Esta é a principal afronta que podemos cometer. Este grupo de coitados que se sente na dignidade de torcer pelo Botafogo, trajados de fúria, estão nos levando para uma das maiores catástrofes de nossa história. São tão espertos e sagazes que ainda hoje não analisaram que nós perdemos quando temos tudo para ganhar e que ganhamos quanto temos tudo para perder. E, mesmo quando esta equação de torna real, os titãs saem da prisão e aterrorizam nossa casa. Alguns parnasianos chamam isto por Roda Viva, eu prefiro chamar por Botafogo. E vou mais além, afirmo que qualquer ser que tem o encéfalo desenvolvido não consegue dormir por medo dos titãs. E eles estão se aproximando, com suas cabeças de dinossauro.
         Este momento histórico em que vivemos me faz recordar de uma cena bem peculiar que é de meu encanto. O protagonista está sentado à mesa, numa reunião familiar, quando uma tia-avó distante resolve interromper seu desafogo psicológico questionando-o sobre o caminho religioso que este daria para sua recém-nascida cria. Assustado com tamanha audácia, pensa no significa de caminho e de religioso e responde sabiamente:
         -Não saberia dizer ao certo, ainda estou em dúvida entre o ateísmo e o agnosticismo.
         Aprendam, meus caros, que o caminho para a gloria não deve ser tramado pelo objetivo, mas pelo acaso. A obrigação e as análises precoces só servem para nos convencer a bater cabeça contra o real, enquanto que de real o Botafogo não tem nada. Volto a repetir, o Botafogo é pura literatura. E qualquer escritor de meia categoria sabe o quão obscuro é a próxima página.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013


A volta do que não foi


Primeiramente, desculpem-me. Estou ciente que este é o título mais pífio que qualquer escritor possa escolher. Porém, compreendam-me: percebi, após o último clássico, que certas coisas correspondem precisamente ao significado de seus nomes, ficando evidente que o Cárceres nascera com o nome devido. Uma tenebrosa surpresa.
Como vocês provavelmente não notaram, o blog esteve de férias nestes últimos meses. Portanto, iniciarei 2013 com um rasteiro resumo dos acontecimentos, em minha vaga opinião, relevantes. Como meu psicanalista imaginário falou que estou sanado e que o tratamento não será mais necessário, aviso desde já que irei menosprezar o meteoro russo, a ordem cronológica e científica dos fatos e a crise existencial do Papa.
Começarei com o pênalti perdido por Ronaldinho Gaúcho contra a Inglaterra, ou seja, contra o país que inventou o Futebol. Meus caros, não quero discutir sobre a convocação dele, apenas decorrer sobre as regras futebolísticas. Estas são as únicas que devem ser respeitadas, dentre todas as esferas. E não me refiro a escanteios, impedimentos ou prorrogações pouco londrinas; atento-vos para as verdadeiras máximas do jogo, tais quais “existem coisas que só acontecem ao Botafogo”, “se concentração ganhasse jogo, o time do goleiro Bruno não perdia uma” e “pênalti mal marcado não entra”. Mesmo Pelé perderia aquele gol.
Falando nele, sigo afirmando que Pelé é rei, única e exclusivamente, quando se encontra de boca cerrada. Mesmo quando concordo com ele, continuo repudiando-o. Todos tratam o Neymar como se fosse o novo Billy The Kid, ou como a encarnação do Caipora ou como o redentor das multidões. Ele não é nada disso. É apenas um simples e singelo imbecil de 15 anos de idade que ainda não percebeu que futebol é jogado com 11 por algum motivo. Recuso acreditar que pessoas que não conseguem levantar a cabeça e observar que existem outros a sua volta possam chegar ao patamar de ídolo indubitável. Prossigo defendendo seu lugar cativo no bando de reservas da seleção e que a morada do rei seja nos States.
Porém, existem outros em pior situação. Todo e qualquer jogador do Botafogo que veste a camisa da Nike retorna amaldiçoado, vide o caso do filho do Chico Mendes. No entanto, como é de praxe, alguém poderá argumentar:
“Mas a seleção é boa, ela valoriza os jogadores...” 
É? Então porque o Lucas não foi vendido logo após seu retorno? Ainda peço assinaturas no abaixo assinado que propõem tornar lei a prisão de certos atletas na Granja Comary e só soltá-los quando estiverem benzidos. Benzidos ou aposentados, tanto faz. Começaríamos, óbvio, com os laterais direitos que não sabem atacar nem defender; ou seja, as faxineiras alérgicas a alvejantes e alcoólatras do futebol.
Elucidando a conversa, acreditei, um pouco mais recentemente, que o Oswaldo tinha compreendido o que era treinar o time de General Severiano. Fatídico engano. Aquele “vamos matar estes putos” foi pronunciado por Odin e, pouco tempo depois, percebemos que não havia passado de uma fantástica interpretação religiosa. E, quem melhor que o Faraó Turco para curá-lo?
A volta do que não foi. Esperaremos os próximos dias para saber como anda os poderes sobrenaturais desta incógnita em forma de ser. Seu histórico é desfavorável e seu futebol é pífio, mas ele veste preto e branco. Como meu ex-psicanalista dizia, nunca confie em um careca oriundo de um império oriental que ri parecido com o Juscelino Kubitschek. É desesperançoso saber que ele é a nossa última esperança. E é exatamente por ter tantos fatores contrários que tenho convicção em seu êxito.
Afinal, esperança nunca foi e nunca será uma máxima do Botafogo.